O Rio Grande do Sul e o impacto dos eventos extremos

Publicado em 14/05/2024 | Texto: Maria de Fátima Andrade*

Edição: Josué de Moraes

Todos nós brasileiros estamos mergulhados em tristeza e desesperança diante da catástrofe climática que assola o Rio Grande do Sul. Nos perguntamos como será possível a reconstrução de tantas cidades após uma devastação tão profunda e de que forma essa reconstrução ocorrerá. As pessoas anseiam por retornar e reconstruir suas vidas nos locais onde habitavam, mas será isso viável? E quais são as chances de eventos semelhantes ocorrerem novamente? Onde e com que frequência?

Na Figura 1 temos um gráfico do número de desastres naturais em diversos países durante o ano de 2023. Pode-se observar que o Brasil é o quarto país mais afetado, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, China e Índia.

Figura 1. Países com o maior número de desastres naturais em 2023. Dados extraídos do relatório do Centre for Research on the Epidemiology of Disasters (CRED).

Nos últimos anos, temos testemunhado um aumento alarmante na frequência de eventos climáticos extremos em todo o mundo, acarretando prejuízos econômicos e, acima de tudo, humanos. O relatório do IPCC de 2022 destaca as regiões mais suscetíveis às temperaturas extremas, inundações e deslizamentos, embora sua resolução não permita uma identificação detalhada das cidades e estados brasileiros. No entanto, projeções baseadas no aumento da temperatura, especialmente com aquecimento superior a 2,0 ºC, elaboradas por pesquisadores brasileiros liderados pelo CEMADEN, revelaram que as áreas de maior risco estavam concentradas no Rio Grande do Sul, seguido por Santa Catarina1.

Não se pode negar os incessantes alertas científicos sobre os perigos decorrentes da falta de preservação ambiental, que não se limitam apenas à redução das emissões de gases de efeito estufa, mas também incluem a preservação de áreas verdes urbanas, essenciais para a absorção de chuvas e a mitigação de temperaturas, bem como da fauna, que desempenha papel fundamental no equilíbrio e na manutenção dos ecossistemas florestais.

Embora muitas cidades brasileiras possuam planos de ação climática, estes, em geral, não são implementados devido aos interesses econômicos imediatistas, que frequentemente obstruem o planejamento de longo prazo. Em muitas localidades, os planos diretores negligenciam o investimento em transporte público e a preservação de áreas verdes. Ainda mais preocupante é a falta de preservação das nascentes dos rios e de suas áreas adjacentes.

Não se trata apenas do controle das emissões dos gases de efeito estufa, mas também da consideração de outras ações de prevenção e mitigação, especialmente nas cidades, onde mais de 85% da população brasileira reside, estando sujeita aos riscos de inundações e secas.

Todas essas questões são fundamentais para mitigar os impactos das mudanças climáticas. Não podemos mais esperar que tragédias como essas assombrem o Brasil. É imperativo que tenhamos aprendido com essas experiências.

É crucial promover uma colaboração estreita entre cientistas e formuladores de políticas para reduzir os riscos e iniciar uma preparação direcionada a uma sociedade mais resiliente.

Referência

[1] Marengo JA, Camarinha PI, Alves LM, Diniz F and Betts RA. Extreme Rainfall and Hydro-Geo-Meteorological Disaster Risk in 1.5, 2.0, and 4.0°C Global Warming Scenarios: An Analysis for Brazil. Front Clim 2021; 3:610433. doi: 10.3389/fclim.2021.610433.

* Maria de Fátima Andrade é professora titular do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo e membro do Conselho Diretor da ACIESP.

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