Mulheres e meninas na ciência: vitórias a comemorar e muito a conquistar

Publicado em 16/02/2024 | Artigo de Vanderlan Bolzani*, extraído do Jornal da Ciência/SBPC, edição 7361, 15 de fevereiro de 2024.

As meninas brasileiras que ingressam hoje no ensino fundamental encontram um cenário um pouco diferente daquele vivido por suas mães 20 ou 30 anos atrás.  Houve avanços no horizonte da vida profissional das mulheres nesse período. Hoje não é um sonho descabido das meninas o desejo de cursarem Engenharia Naval, atuarem no campo da Física Nuclear ou tornarem-se neurocirurgiãs. Os exemplos positivos vão se somando e consolidam um processo muito lento, mas irreversível.

No início deste século XXI, apesar do ritmo frenético de mudanças tecnológicas, permanece, entretanto, a questão fundamental de saber como reduzir as desigualdades sociais e econômicas que continuam existindo entre homens e mulheres.

Em 2015, a agência da ONU para as áreas de Educação, Ciência e Cultura, UNESCO, decidiu instituir o dia 11 de fevereiro como a data em que o mundo deve reconhecer a importância da participação de mulheres e meninas no campo da ciência. Durante esses nove anos, quando se olha para o panorama global, a evolução rumo a esse objetivo foi modesta, mostram os dados apresentados pela UNESCO.

Em termos globais, diz a página da ONU/Mulheres, somente 33% dos pesquisadores das universidades são mulheres. Elas recebem menos financiamento dos fundos de pesquisa e têm menos probabilidade de serem promovidas. As mulheres representam apenas 28% dos profissionais trabalhando com inteligência artificial e 28% dos graduados em Engenharia. No setor privado, estão menos presentes nos cargos de liderança das companhias e em cargos técnicos das empresas de alta tecnologia.

Essa constrangedora constatação nos leva a questionar o bom senso de uma sociedade que abre mão de incorporar grande parte de seus cidadãos do sexo feminino a seus quadros de dirigentes especializados. Isso representaria uma valiosa contribuição para o esforço do desenvolvimento econômico dos países.

No Brasil, quem se dispuser a passear pelas páginas da web vai encontrar um grande número de iniciativas referentes ao dia 11 de fevereiro, com o objetivo de promover e estimular a presença de mulheres e meninas nas carreiras científicas e tecnológicas.

Essas ações afirmativas de grande importância vão crescendo em número e se inserem na coluna dos ganhos obtidos nos últimos anos pelo movimento em prol da equidade de gênero. Para se alterar as estatísticas, é preciso mudar a visão de mundo da sociedade conservadora. E isso se faz com palestras, conferências, premiações e celebrações como a de 11 de fevereiro. Órgãos do governo e universidades públicas vêm desempenhando um papel fundamental nesse sentido, ampliando as discussões sobre gênero e criando programas de estímulo a meninas que despertam para o fascinante mundo da pesquisa científica.

Em 2019, iniciativa de destaque nesse sentido foi a criação, pela SBPC, do Prêmio que leva o nome da psicóloga e educadora Carolina Bori. A premiação contempla pesquisadoras da universidade e abre espaço especial para meninas do ensino médio, estimulando vocações que se afirmam nessa faixa etária.

No mundo empresarial, a adoção de políticas de inclusão e de promoção da igualdade de gênero tornou-se, nesses vinte anos, um distintivo a ser exibido nos balanços sociais em resposta aos acionistas.

Mas é relevante lembrar também outra diferença entre as duas gerações de mulheres. Para as meninas e adolescentes de hoje, a luta por oportunidades iguais no acesso às carreiras científicas, por remuneração justa e reconhecimento, não pode ser um objetivo isolado. É impossível não ver que ela está fortemente entrelaçada com outras preocupações como a redução da desigualdade social. Uma em particular, que se torna mais urgente a cada ano, é a questão ambiental, o aquecimento global e a necessidade de construir um mundo sustentável. Afinal, as meninas e adolescentes de hoje, além de avançarem em suas carreiras científicas, terão a obrigação de legar a seus filhos um mundo melhor do que o atual, mais justo socialmente e mais saudável do ponto de vista ecológico.

*Vanderlan da Silva Bolzani é professora sênior do Instituto de Química de Araraquara, Universidade Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (IQAr-Unesp) e membro do Conselho Diretor da ACIESP.

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